sexta-feira, 26 de abril de 2013

Cadê o Montesquieu que estava aqui?


montesquieu

Dentre as diversas razões pelas quais me mantenho afastado de política partidária, há a percepção de que, por ali, os consensos são usados tão somente para marcar posição perante o adversário. Para dar um exemplo claro, foi o que aconteceu com a reforma da previdência, para a qual o PT armou um escarcéu perante FHC e logo em seguida tocou o projeto tal e qual. Agora fazem o mesmo, ou pior, no tocante à independência dos poderes, o que é mais grave.

Quando FHC era acusado, com justiça, de deturpar a função das Medidas Provisórias para hipertrofiar o executivo em proveito próprio, acompanhei toda a discussão no plano político e acadêmico, e a “intelectualidade petista” estava conosco na universidade. O que fez o PT quando chegou ao poder? Deu perfeita continuidade à prática.

Como não se podiam contentar com a simples herança deixada pelo boçal da Sorbonne, temos em andamento a tal PEC 33, visando a submeter o Supremo Tribunal Federal ao Congresso. Estroncando os outros parafusos do sistema de “freios e contrapesos”, que até a pouco defendiam os petistas, fervorosamente na política e cheios de frescuras pra falar Montesquieu fazendo beicinho na universidade.

Por que Dilma nunca deu um “piu” a respeito da piada Feliciano? Ora, é uma figura interessante no Congresso. Numa casa abarrotada de vira-latas, após algum adestramento, quem controla a distribuição de ração, controla também o balançar dos rabos. Que tal um congresso adestrado que, de quebra, mantém a Corte Constitucional enlaçada na mesma coleira? E quando já temos uma mordaça encomendada para o Ministério Público?

Outra peculiaridade do caso é que a PEC 33 é iniciativa de Nazareno Fonteles, do PT, tendo como relator e entusiasta da ideia na câmara o deputado tucano João Campos. Ou seja, o PSDB que corria risco de morrer de fome após tanto tempo longe da mamadeira do fisiologismo, começa a comer da ração dada aos demais vira-latas. Sinaliza a certeza de que, caso chegue novamente ao poder, a tucanada levará consigo tal plano. Afinal o PT é o aluno mais brilhante que o PSDB já teve, e não há razão para não endossar seus projetos, naquilo em que for oportuno.

A soma dos dois golpes à independência dos poderes, do primeiro dado por FHC e do segundo orquestrado pelo PT, tem o efeito de desfigurar a própria definição do Brasil como república. O dito “império da lei” não se mantém nesse quadro, onde as decisões cabidas à Corte Constitucional são submetidas, na maior parte das vezes, àqueles que deram causa aos conflitos apreciados nas ações. Tudo isso num cenário onde o executivo já se encontra legislando há tempos e onde a vulgaridade do “toma lá dá cá” mantém o Congresso bastante domesticado perante a presidência. Enfim, dobra-se o STF, dobra-se a própria legalidade em sentido amplo.

Dizem que o problema da politica é a politicagem que corre sob ela. Aqui o caso é bem mais grave. Não há política. Há uma micropoliticagem, que é a politicagem propriamente dita, e a macropoliticagem que substitui a política. Por essas e outras, prefiro sentar na janela e ver essa parada passando, e tacar uma pedra aqui e ali. Participar da parada, não me atrai. Deixe-me com minhas pedras.






sexta-feira, 29 de março de 2013

Ninguém colocou esteroides na sua whey protein


deca protein
Há um mito circulante, inclusive entre profissionais de saúde, segundo o qual a indústria de suplementos estaria, ocultamente, incluindo esteroides anabólicos em seus produtos. Argumenta-se que seria uma maneira de potencializar os efeitos prometidos, satisfazer a clientela, talvez até de provocar dependência, o que é ótimo pra qualquer negócio. O problema é que não faz sentido a inclusão de anabolizantes hormonais em suplementos de proteína por uma razão: não compensa financeiramente!

Há mil argumentos para criticar essa indústria, inclusive a embalagem imbecil acima, que faz alusão a um anabolizante hormonal vendido no Brasil pelo laboratório Organon, mas podemos ter certeza de que não há nenhum esteroide em seus suplementos de proteína por um motivo que põe fim a qualquer discussão: adicionar essas drogas aos produtos, numa dosagem diária capaz de promover anabolismo, deveria triplicar ou quadruplicar o preço de qualquer um deles para que a venda permanecesse lucrativa.

Os anabolizantes hormonais são ésteres de variações da testosterona. Essas variações são projetadas para atenuar alguns de seus efeitos, potencializar outros. Entre essas variações, os ésteres 17-alfa-alquilados são geralmente usados para administração oral, pois conseguem atravessar o sistema digestório, continuando passíveis de absorção e de efetividade. Há três problemas referentes a essas variações em particular: elas costumam ser mais caras e também destacadamente hepatotóxicas além de inibirem o eixo hipotálo-hipófise-gonadal (HHG), sem promoverem efeito virilizante.

Caso a alegada inclusão de anabolizantes hormonais nos suplementos de proteína fosse realmente prática dos laboratórios, teríamos necessariamente três consequências esperadas:

  1. uma considerável alta nos preços desses produtos, porque ninguém iria vender proteínas e dar esteróides anabólicos fazendo caridade;
  2. o aparecimento frequente de usuários com hepatite medicamentosa, tendo em vista a agressão hepática advinda dos 17-alfa-alquilados, somada à elevada ingestão de bebida alcóolica que faz parte da nossa cultura.
  3. a castração química temporária de quem estivesse tomando esses produtos, uma vez que todos os 17-alfa-alquilados inibem a produção de testosterona endógena, ao mesmo tempo em que não promovem efeito virilizante.
Nessa temática, vários equívocos se perpetram no discurso de profissionais de saúde. O primeiro se dá quando consideram que a dosagem dessas drogas, indicada para promover anabolismo em um praticante de musculação, é exatamente aquela que está na bula, indicada para o efeito terapêutico das referidas drogas.

Na verdade, as dose capaz de promover anabolismo muscular num corpo já treinado chega a ser, para alguns desses fármacos, cinco vezes maior que aquela indicada na posologia do medicamento, escrita na bula. Isso faz com que os custos desse tipo de uso se elevem, juntamente com os riscos de efeitos colaterais, entre eles o do desenvolvimento de uma hepatite medicamentosa.

Supondo que os malévolos fabricantes de suplementos estejam incluindo drogas sub-dosadas em suas fórmulas, como solução para o problema de custo, o tiro sairia pela culatra. O uso de esteroides em dose inferior à conhecidamente efetiva, para fins de anabolismo muscular, tende a ter efeito contrário, tendo em vista que a produção de testosterona endógena é, mesmo em baixas dosagens, pesadamente reduzida, pela inibição do eixo HHG. Nesses casos, além de a droga não surtir efeito, ela priva o sistema da testosterona produzida naturalmente, o que provoca a perda da libido e, dependendo da duração do efeito, provável perda de massa muscular.

Os usuários de drogas anabolizantes, aqueles que usam sabendo com o que estão lidando, têm o cuidado de administrar, concomitantemente, testosterona em doses terapêuticas, sempre que fazem uso de variações não virilizantes. Isso evita a dita "castração química" temporária, uma vez que a droga injetada substitui a testosterona endógena na manutenção da libido. Ademais, o uso de 17-alfa-alquilados nunca deve ultrapassar 6 semanas, devido à hepatotoxicidade.

Com isso, podemos prever o efeito catastrófico do uso dessas substâncias por quem as viesse a ingerir inadvertidamente, associadas a suplementos de proteína, por prazo indeterminado e sem outras cautelas. Esses efeitos jamais passariam despercebidos, o que serve para desmentir essa propagada teoria de conspiração.

O uso continuado tenderia a causar, além da já mencionada “castração química”, redução da massa muscular. É difícil imaginar que alguém possa usar tais efeitos como estratégia de promoção de seus produtos. Não se trata de confiar na indústria, o problema é que a estratégia não faz sentido. Ninguém pagaria por um pó achocolatado que prometesse favorecer o desenvolvimento muscular mas que, na prática, deixasse o usuário mais fraco, sem qualquer interesse por sexo, e amarelo, ictérico.